quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Quarup, Antônio Callado (Projeto 1964 Nunca Mais)



Título: Quarup
Escritor: Antônio Callado (Brasil)
Ano de Publicação: 1967
Editora: José Olympio
Páginas: 574
Gênero: Drama, Romance, História
Nota: ♥ ♥ ♥ 


Li Quarup, do brasileiro Antônio Callado, para o Projeto Lendo a Ditatura / 1964 Nunca Mais, cujos detalhes podem ser obtidos clicando aqui.

Essa é uma obra de fôlego, contendo quase 600 páginas que acompanham a história do Brasil desde 1954, ano em que Getúlio Vargas morre, até pouco mais de 1964, quando a ditadura militar tem início. Ler essa obra tão grandiosa é voltar os olhos para o passado, buscando compreender o futuro do Brasil, o que se encaixa como um luva no nosso atual momento histórico.

Quarup é o livro mais famoso de Antônio Callado. É uma obra politicamente engajada, que discute a identidade do Brasil enquanto país, enquanto nação. Seu protagonista, o padre Nando, é uma metáfora para todo o povo brasileiro, em sua constante busca por objetivos, por definições e por valores. Em muitos aspectos, por suas grandes ambições, Quarup me lembrou Viva o Povo Brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro. Quarup, contudo, é uma obra mais voltada para a realidade política do Brasil, enquanto Viva o Povo Brasileiro foca mais nas questões sociais e raciais.

Na primeira parte do livro somos apresentamos a Nando, um padre idealista cujo maior sonho é educar os índios do Xingu, na região da Amazônia. Nando é fascinado pela ideia de um ser humano em seu estado natural, sem as corrupções advindas da vida em sociedade, e acredita que as missões jesuítas criadas no sul do Brasil, na época colonial, foram o ponto alto de nossa história. 

É com esse objetivo que Nando vai até o Rio de Janeiro, obter do SPI (Serviço de Proteção ao Índio), o embrião da atual FUNAI, uma autorização para instalar-se no Xingu. Aí transcorre a segunda parte do livro. O Rio de Janeiro que Antônio Callado nos apresenta aqui é repleto de corrupção e nepotismo. Há uma elite inconsequente, que abusa da droga do momento: o lança-perfume, um derivado do éter. É nesse clima de carnaval e alegria que Nando vai deixando suas preocupações de lado. Até mesmo seu voto de castidade vai aos poucos deixando de fazer sentido. 

A terceira parte do livro, minha favorita, é dedicada ao Xingu e aos índios, e é quando os valores e ideais de Nando são realmente colocados à prova. Aqui descobrimos o significado de Quarup, um ritual indígena em que os mortos são simbolizados por troncos de madeira, que ressuscitam durante os cantos e danças, em celebração aos ancestrais, e ao final são destruídos pelas águas do rio. 

Um dos personagens mais emblemáticos do livro está nessa terceira parte. É o também idealista Fontoura, que ama os índios e a amazônia mais do que a si mesmo. Suas decepções são tamanhas que ele se torna um pessimista e um alcoólatra. É quando Nando percebe que seus objetivos não serão alcançados no centro do Brasil e que os índios não são sua salvação ou a do Brasil, já que são tão impuros quanto qualquer outro ser humano. O ideal de perfeição de Nando é posto à prova e cai por terra, devorado pelas formigas.

A quarta e última parte do livro, que é a mais pertinente ao projeto, acompanha Nando desde que os preparativos do golpe militar até pouco mais de 1964. É aqui que o personagem é torturado, espancado e quase reduzido à insignificância, até que finalmente amadurece, consolida seus ideais e faz sua grande escolha de vida: a luta, junto aos camponeses, pela libertação do Brasil.

Um personagem dessa última parte serve como bandeira da luta contra a ditadura: Levindo, um espécie de Che Guevara brasileiro, um homem que viveu e morreu por seus ideais. Era a pureza que Nando tanto tinha buscado, primeiro nos índios e depois em Francisca, o grande amor da sua vida, e que nunca tinha encontrado.

O ritual que dá título ao livro ilustra o que acontece com Nando e com o próprio povo brasileiro ao longo de sua história. Os mortos e o passado são revividos, são homenageados, são compreendidos, e são finalmente descartados, para que tenham início um novo tempo, uma nova vida, em que o Brasil deixará de buscar soluções para os seus problemas em um passado idealizado e irreal e voltará seus olhos para um futuro melhor e mais brilhante.  

4 comentários:

  1. Estou descobrindo livros ótimos no projeto. Esse mesmo eu só conhecia de nome, mas nunca tinha ido atrás para saber mais. Acho tão raso pensar nos índios (e tribos em geral) como seres ingênuos, perfeitos e livres de todo tipo de falha. São humanos, não são? Logo, cheios de defeitos, como qualquer um. Enfim... gostei muito da ligação do título com o comportamento brasileiro de ver, resgatar e esquecer, esperando sempre por um milagre do futuro e fingindo não ver os problemas atuais para não ter que de fato pensar em como resolvê-los.
    Beijo!

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  2. Nossa que show, ainda bem que resolvi passar por aqui, antes de chegar o Black Friday... Quero esse livro.
    bjs
    www.estavalendoedai.blogspot.com.br

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  3. A parte que começa a retratar a ditadura começa em que página?

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  4. A parte que começa a retratar a ditadura começa em que página?

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